A prece



(...)

No espaço estavas lá




Foi quando Me encontraste, mais uma vez,
pela terceira, e Te Re-conheci.
Mais fruto maduro, mais Tu e mais aqui.
Estava para te escrever,

mas não posso dizer aquilo que ainda não sei.
Do quanto mais longe foste, mais perto Me ficaste.
Não me esqueceste nem na neve depois da praia,

nem nas esperas,
nos entretantos e entre tantas, antes e depois.
E sempre sentiste.

Soubeste-O sempre.
Levaste-me para todo o lado.
Tu com tanta gente e sozinho,

e eu encontrada perdidamente
com a minha pressa de viver e não chegar a lado nenhum.
A pressa de descobrir O que já tinha enterrado.
A vida apressada é como a vida de um cão

que dá três voltas em conhecimento
para se sentar no mesmo sitio.
Mais sabido, mais sentido, mais consciente.
Saiba-se que até os cães pensam

mais que não seja a dormir.
E nesse encanto ficavas lá nas nuvens

como quem dá tudo por alguém,
como se de uma coisa eu me tratasse.
Sem expectativas,

com a convicção expectante de me ver chegar.
E é esse Valor que temos e ao qual
não atribuíamos significado nenhum,

que nos vai preenchendo,
que nos assola e sabemos que é ali.
No espaço estavas lá.

Soube então o que não era:
Se já te tinha, não precisava mais do que isso.

Assim Tu...certo, Imperfeito, simples.





O poder da Igualdade



Que desconcertante trio de conversa feminina.
Elas convictas de que numa relação há sempre uma monarquia.
Que há sempre um subordinado e a sua senhoria.
Eu, de opinião inflexível, com consciência
de uma vontade equitativa transversal à realidade.
É escusado quererem estilhaçar a minha visão democrática.
É transcendente ao vosso poder irrefutável.
Com intuição inalienável, sigo.
Na cauda do perigo- a
Solidão.
Sim... na borda da impossibilidade dificilmente se encontra
a igualdade entre dois seres heterogéneos.
Mas...
Não... não nasci na casa real e a escravatura,
com alguma candura, já está demodé.
A aporia começa no descentralismo
mas deve findar na unidade.
A cedência em perspectiva conjunta – sermos esse Todo que É: Nós.
Não é de génio mas tem a genuinidade de uma existência: a Minha.
E tem a feição de um semi-ser: a Tua.
Caminha ao lado da tua Sombra
que se projecta em todas as direcções, mas não se afasta.
Subjuga-te somente à eloquência de ser Quem És.

Animal Mulher




Ferve-lhe o tutano
Pela falta de vida destes seres
Desprovidos de salsa, brilho e direcção.

Morena, Loira, Ruiva
do jeito que a vida se prostra à sua cintura

Animal Mulher,
Mãe de surpresa e rija de punho
já amorteceu um soco marca de guerra aberta.

Muralha de profissão
que quando cai se estatela no ar e se propaga por terra
Tantas as vezes quantas as que se impõe
e regozija altiva no cume do céu.

Fosse a flor –Azeda - na primeira degustação,
e agridoce quando assenta e fica no goto.

Fosse a lei da sobrevivência na saliência do risco
que se esfola por chegar onde quer.

Sei que não entende
como pode alguém não ter uma pitada de pimenta,
de sal ou de fogo
Não estar, não ser, e existir apenas porque
é matéria e dá o corpo ao manifesto.

E fica derreada com este sub-amor digital e funesto
pensa “quem sabe sou eu que não presto”
pois de resto ela fica, e os outros fogem,
Entre os seres de âmago eterno e os morrem.


Animal Mulher -Ela É- do jeito que ela quer
na Emoção que a Vida gosta.


A verdade dos Outros






Se existem tantas verdades quantas as pessoas
então anda tudo a ver só o que quer.
Uns vêem ao quadrado, outros só se vêem ao espelho
mas anda tudo em corropio para saber a verdade dos outros.
Não é que às vezes lhes importe,
como se o saber fosse posse de uma verdade verdadeira

mesmo que não seja a nos
sa,
mesmo que não condiga connosco.
Há praí ainda quem goste de desbravar a verdade dos outros
e pagar com verdades baldias.
E neste alvoroço uns perguntam e fazem-se de cegos
se a resposta incomoda.
Outros gostavam mesmo de a possuir,
mas têm fraqueza para interrogar.
Como se a Verdade tivesse de pedir licença para ser dita!
Como se fosse calada
deixasse de ser Verdade por causa disso!

Eu afinco pé na Verdade única inconsequente.
Até aos seus farrapos. Até cair pró lado de velha.
E quando não quero fazer-me de míope,
limito-me ao silêncio inquestionável.

Afinal ninguém é perfeito.
Doravante deveríamos chamar Verdade aquilo que o é,
seja ela qual for,embora tema que o medo da Verdade

seja a mentira no seu esplendor.
.
Diz-me então qual é a verdade que te posso dizer,

pois pode não ser aquela que queres ouvir


Calibre 77

Eles dizem que infligimos respeito.
Querem-se machos, dominadores, com o potencial do último latido
fora da cama.
Neste secreto podem e querem ser submissamente arrebatados e dominados .
Se querem ser lidos e se lhes decora a frente e o verso sentem-se esborrachados contra tamanha magnificência.
Evaporam-se cambaleantes como quem deu um tiro no próprio pé só para mais tarde voltarem e expressarem a sua impotência.
É a dor do prazer que os move sentem-se extasiados com tamanha feminilidade assexual.
Então qual é o calibre perfeito?
Primam o gatilho e disparem ao ritmo da bala.
O calibre vermelho dos saltos fere, alastra-se, corrói. Nasce por dentro e odeia-se.
Nega-se e ama-se.
O medo adoça tudo o que não se quer. Mas sente-se.
E é incandescente. E é um abismo. Mas quem não gosta de espreitar à beira do precipício?
Aceitem o receio. Sejam quem querem ser. Acertem no alvo.
Elas não matam. Rebentam em flor.

Moldura Humana



Tantos são os gostos que os outros têm
em formas em torsos, em cores em rostos
Em moldes que o seu esboço trás
que se destilam numa pose mordaz.

Enquanto transpiram o ar embevecido
ele absorve o que pode
com o desespero de possuir aquilo que não sabe sentir
numa subtracção de si.

Salteia com adornos a tela castrada
de forma a compensar a figura descompensada
plagiando quem por si passa.

É talvez uma qualquer coisa
que intente não ser desgraça.
Em exposições de migalhas
cobrem-se as falhas com beijos de traça.

Queria ser artista,
obra de arte
ser omnipresente
fascinar em toda a parte...

Queria ser um Deus,
mas nem chega aos calcanhares de uma pessoa!
e em galerias de sanções vai pintando perdões
por se saber existir à toa.

Quem sabe pudesse chegar às saias de um altar,
não fosse, pertencer a uma colecção vulgar
cada vez que quer mostrar
tudo aquilo que não é.


ps: mais uma imagem do "fonógrafo"
que já se vai tornando um hábito :p